6 de maio de 2010

Casais que se separariam na literatura se os autores terminassem de contar a história (Parte II)

Todos nós sabemos que escrever um romance e transformá-lo em um cânone da literatura não é para qualquer um. Muitos tentaram, poucos conseguiram! Imortalizar personagens, torná-los referência é missão digna de heróis como Chuck Norris, Jack Chan, Macgyver e hoje o Jack Bauer, especializados na arte milenar do chupar cana e assoviar ao mesmo tempo. Apesar de nossos heróis contemporâneos conseguirem socar tubarões e construir shopping centers com uma casca de banana e uma caneta Bic, nada se compara à difícil arte de criar personagens que atravessarão o tempo e te encherão o saco nas aulas de literatura.

Apesar de nossos autores funcionarem quase sempre como um misto de cupido, padre ou juiz de paz, juntando nas páginas dos livros os casais amorosos até que a morte os separe, a história nos dá sempre brechas para descobrir quem consegue ser resiliente e ir até o fim ou quem pula do barco, antes mesmo que este afunde, sem levar em conta mulheres e crianças. Se o barco tiver complexo de Titanic, sem dúvidas irá a pique.

Dentre os casais que cuidadosamente selecionei e que nem por intervenção divina conseguiriam ficar juntos, caso seus criadores não tivessem dado um jeito neles antes de acabar a história e vê-los imersos na rotina diária, estão:


  • Peri e Ceci: O casalzinho, criado pela mente obcecada do José de Alencar, que resolveu antecipar em sua literatura a moda da trilogia, com O Guarani, Iracema e Ubirajara, é composto por um índio, o bom selvagem Peri e a mocinha loira, frágil e delicada, Ceci. O índio, já pra lá de catequisado, vê em Ceci a imagem da virgem Maria. Ceci vê no índio devoção e muita pele exposta. Os dois até que chegaram vivos ao fim da história depois de uma enchente, mas não dariam certo se Alencar resolvesse contar o que aconteceu depois da terra secar e deles descerem da árvore, onde ficaram esperando a água baixar. O casal não ficaria junto por causa exclusivamente de Ceci. A garota, moça de família, virgem de todos orifícios e imagem-semelhança da virgem Maria, não havia sido instruída pela sua mãe sobre os deveres de uma mulher na noite de núpcias. Atrás das moitas, sem champagne, lareiras e pétalas de rosas, Peri mostraria a Ceci sua lança de herói medieval tupiniquim. Ceci, assombrada e sem saber o que fazer com aquilo, sairia correndo pelas matas fechadas, até cair em um buraco cheio de areia movediça e morrer sufocada,. Enquanto isso, Peri fundaria a nação brasileira com uma degradada qualquer que viesse de Portugal, entocada nos parões de algum navio;

  • Zeus e Hera: Diretamente do Monte Olimpo, temos este casal, que atravessou o tempo e ainda é lembrado nos dias de hoje. Hera e Zeus eram irmãos e se casaram no tempo que incesto era considerado algo banal. Todo mundo casava com irmão, seduzia a mãe, era uma verdadeira orgia a céu aberto. Depois, a culpa cristã chegou e na Idade Média eles ficaram esquecidos por um tempo, voltando só depois no Renascimento. Zeus e Hera, apesar de serem deuses poderosos, eram acometidos pelas mesmas falhas humanas. Zeus era um galinha, que colecionava amantes em cada esquina da Terra e Hera se comportava como toda mulher traída, sendo deusa ou mortal... Subia nas tamancas, dava escândalo, perseguia as amantes do marido, fazia greve de sexo, mas não admitia o divórcio. No caso deles, separação seria difícil. Nenhum dos dois abriria mão dos confortos do Olimpo e da ambrosia, logo viveram infelizes para sempre, separados em casa, unidos apenas pelos laços do matrimônio. Dizem que até hoje Zeus se fantasia de animais e procura mulheres adeptas da zoofilia, enquanto Hera assiste as reprises de Desperate Housewives;
  • Bentinho e Capitu: Em Dom Casmurro, Machado de Assis resolveu não perder tempo e já deu cabo do casal, antes mesmo que a relação se desgastasse ainda mais. A história ficou famosa e é referência até hoje porque ninguém sabe se Capitu realmente transformou seu adorado Bentinho em um alce, traindo-o com seu melhor amigo, Escobar. Ninguém sabe se: Capitu resolveu dar uma variada no cardápio; se Bentinho assistiu demais o Sexto Sentido e começou a ver coisas demais; se Escobar e Bentinho eram mais que grandes amigos, enfim... "há mil maneiras de se preparar Neston... invente uma!". Ninguém sabe, ninguém viu. O que se sabe é que o casal não daria certo, mesmo que o Machado de Assis resolvesse dar outro fim à história, não causando assim tanto estardalhaço, o que obviamente não tornaria o romance um cânone de nossa literatura. O que sabemos é que de um jeito ou de outro, Bentinho, tendo razão ou não de sua desconfiança, acabaria com o casamento por causa da insegurança, o que geraria discussões intermináveis, noites dormidas no sofá, muita música sertaneja, entre tantas manifestações de descontrole emocional. Não tem jeito. Este casal foi fadado, na literatura universal, a pegar cada um o seu caminho. 




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